transambista

...e aí vai o Caetano (merci Larissa)!

Travestis e 'transamba' na noite caetânica

diz a legenda -
de Caetano para Mautner: "esse cara tem sido um mestre pra mim"


Obra em progresso: Na estréia da temporada, baiano apresenta inéditas que anunciam os (bons) caminhos que devem levar a seu próximo CD [Leonardo Lichote]

Caetano Veloso apresentou novos personagens, como a preta do biquíni amarelo (“Cor amarela”) e o garoto carioca favelado (“Perdeu”) — um “Meu guri” sem ternura.

Mas na estréia de “Obra em progresso”, anteontem no Vivo Rio, quem causou frenesi foram antigos amigos: três travestis saídos de uma canção sua pouco conhecida de 1977. Os primeiros versos — “Três travestis/Traçam perfis/ Na praça” — causaram uma gargalhada na platéia que obrigou o cantor a parar e começar de novo.

Ao fim da música, gravada por Zezé Motta em 1982, falou do “querido amigo Ronaldo”: — Como esse show é semanal (sempre às quartas-feiras, com exceção da próxima, até 18 de junho), tem esse aspecto jornalístico. Fiquei na dúvida se tocava, mas ela tem
poesia e a poesia deve se impor. O futebol de Ronaldo é poesia. A parte íntima da história não interessa a ninguém. A vida é complexa e bonita. O que ficou para mim da fala dele foi: “Eu não quis dar aquele dinheiro mesmo ameaçado”. Isso é um craque que diz.

O lado jornalístico teve ainda “O maior castigo que eu te dou” (“É não te bater/ Pois sei que gostas de apanhar”), de Noel Rosa — tocada no bloco voz-eviolão, que teve ainda “Minha flor, meu bebê” (interpretação na medida exata da doçura e malícia da canção de Cazuza).

Caetano dedicou o samba do Poeta da Vila “ao Ministério Público e às mulheres que ficaram ofendidas com ‘Tapinha não dói’”, lembrando a recente condenação do autor do funk, acusado de incentivar a violência contra as mulheres. — Espero que não processem ele (Noel Rosa) também.

Primeiro show da série que se propõe a acompanhar a criação de um disco, a estréia teve mesmo cara de início de jornada. As experiências com a nova sonoridade que provavelmente estará no fim da estrada se insinuam nas inéditas e (menos) na releitura de sucessos (“Leãozinho”, “Cajuína”). E, de forma irregular, atravessam o repertório, mais em algumas partes, como nos fragmentos do show “Cê” e na releitura de “Pé da roseira”, da primeira safra tropicalista de Gilberto Gil.

Ou na participação de Jorge Mautner (escudado por Nelson Jacobina), que mostrou “Eu não peço desculpa”, “Vampiro” (em carimbó turbinado) e “Manjar de reis”.

— Esse cara tem sido um mestre para mim. Fiz um disco com ele (“Eu não peço desculpa”, de 2002) que foi a libertação das minhas formas musicais — disse Caetano, dando a Mautner o crédito pelo início da mudança do refinamento representado por sua parceria com Jaques Morelembaum ao pop mais cru que faz hoje.

Experiência com samba arrebata já na abertura

Provável linha mestra do próximo disco, o flerte com um novo samba — ou “transamba”, como Caetano propôs para nome do CD — é o que há de musicalmente mais forte no show.

Gestada no encontro do baiano com a sempre vigorosa e surpreendente Banda Cê — Pedro Sá (guitarra), Marcelo Calado (bateria)e Ricardo Dias Gomes (baixo e teclado) — e com o eventual reforço dos percussionistas gêmeos Josino Eduardo e Eduardo Josino, a sonoridade arrebata já na abertura, com a inédita “Perdeu”.

A guitarra percussiva de Sá, a batida concisa de João Gilberto lida de forma dura, seca e suja, os acordes graves do baixo tocado como um violão, versos como “Antes assim do que viver pequeno e bom” — tudo anuncia quão longe pode chegar o novo álbum.

As inéditas passeiam pela beleza simples e sintética de uma parceria de Caetano com Pedro Sá, além da linda e estranha “Por quem”, cantada em falsete sobre teclados oníricos. “Cor amarela” é uma jorge-beniana ode à musa de biquini. Outra, que paquera o sambareggae, traz versos como “Tarado ni todo mundo nu”. Há ainda um samba-rap sobre a prisão de Guantânamo.

Sexo, ternura, violência — matérias que erguem o contemporâneo transamba de Caetano, um dos sambas possíveis hoje. Portanto, quando diz que “você não me conhece” (“You don’t know me”) e que “o samba ainda vai nascer” (“Desde que o samba é samba”), a promessa, para os ouvintes, é de felicidade.

Um comentário:

Anônimo disse...

De rien, Dimitri. :)