até no Globo

...tem notícia que preste. basta procurar.

essas aqui eu já facilitei o serviço:

1 - "A função dos ídolos de massa na sociedade do espetáculo é viver o simulacro de uma vida plena que nos é continuamente roubada"

Maria Rita Kehl in "muito além do espetáculo", org. de Adauto Novaes. matéria sobre o lançamento do livro na íntegra aqui (original no caderno 'Prosa & Verso' do globo, agora no site 'Observatório da Imprensa')

2 - "
Quando o Estado institui raça como critério para a distribuição de
direitos, a tendência é de fortalecer a crença em raças e, em conseqüência, o
racismo.
(...) Temo que isso acabe fortalecendo
um Brasil imaginado não mais como país mestiço, mas como uma nação de raças
estanques.
"

Peter Fry, Antropólogo, em entrevista concedida a Luciano Trigo (também no 'Prosa & Verso', aliás na mesma edição); a íntegra está logo abaixo.

porque eu sou mameluco.

e você não é branco não.

---
entrevista de Peter Fry (não confundir com o Stephen :) os grifos são meus.

‘A democracia racial infelizmente virou vilã’

18/6/2005 - Brasil - O Globo

Na contracorrente do pensamento dominante no Brasil sobre raças, o antropólogo
inglês Peter Fry expõe seu pensamento em “A persistência da raça — Ensaios
antropológicos sobre o Brasil e a África austral” (Civilização Brasileira). Com
base na sua experiência em países africanos e numa longa reflexão sobre a
questão racial brasileira, Fry afirma que a raça é um mito social poderoso, que
já causou danos incalculáveis, principalmente quando adquire a força da lei.
Contrário à intervenção estatal na definição “racial” dos cidadãos, ele indaga
se a ação afirmativa e a política de cotas não terão como efeito negar um Brasil
híbrido a favor de um Brasil de raças distintas.

Luciano Trigo

Especial para O GLOBO

Em “A persistência da raça” você revela desconforto com a análise hoje dominante
da questão racial no Brasil. Poderia resumir as razões desse desconforto?

PETER FRY: Na análise dominante da questão racial, o Brasil é imaginado como um
país de duas “raças” em conflito. Não vejo este Brasil nem nas etnografias e
muito menos na minha experiência de cidadão. Mas a repetição deste discurso faz
com que ele se torne uma profecia que pode ser cumprida. Queremos uma sociedade
de “raças” distintas? A constatação da existência de preconceito e discriminação
racial é correta. Aliás, tais preconceitos e discriminações são infelizmente
universais. Mas esta constatação não deveria implicar a rejeição da utopia de
uma sociedade a-racista. O Brasil é um dos poucos países que construíram uma
ideologia nacional a-racista. Essa ideologia passou a ser chamada de democracia
racial. Infelizmente a democracia racial virou vilã, em vez do racismo em si.

Com a política de cotas, pela primeira vez a raça virou no Brasil uma entidade
jurídica. Que impactos essa política pode ter sobre as relações raciais a longo
prazo?

FRY: Quando o Estado institui raça como critério para a distribuição de
direitos, a tendência é de fortalecer a crença em raças e, em conseqüência, o
racismo. O caminho de volta para uma ideologia a-racista se torna muito difícil
de tomar. Em todos os lugares do mundo onde Estados seguiram o caminho de
racializar a legislação, as conseqüências foram nefastas. África do Sul e Ruanda
talvez sejam os exemplos mais extremos e mais terríveis. Espero que a forte
ideologia da mistura vença a longo prazo. Mas não sou otimista neste sentido.

Você critica a agenda política do movimento negro, segundo a qual somente os
negros podem falar dos seus problemas. Quais os perigos disso?

FRY: Não me cabe criticar a agenda política do movimento negro. Estou tentando
engajar a sociedade como um todo. Os movimentos de minorias mais bem-sucedidos
são aqueles que conseguem angariar o apoio da sociedade como um todo, e
transformar atitudes negativas em atitudes positivas. Os movimentos das mulheres
e dos homossexuais são exemplos disso.

Você considera que o Brasil está copiando o modelo americano de abordagem da
questão racial, com a política de cotas e a ação afirmativa?

FRY: Na verdade a Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu contra as cotas per
se. Apenas permite que se leve raça em consideração na alocação de vagas
universitárias. Ao introduzir cotas, o Brasil inovou. Mesmo assim, o Brasil está
mimeticamente falando de “raça”, como se tivesse as mesmas características dos
Estados Unidos, onde quem tem uma gota de “sangue negro” é considerado negro, e
onde o pertencimento racial transmite valores, estilos e modos de vidas
distintos. Por exemplo: existe nos EUA uma maneira de falar própria dos negros.
Respondendo ao telefone, você sabe a “raça” de quem fala. Aqui se pode adivinhar
talvez o gênero da pessoa, a sua região de origem e o seu grau de instrução
apenas. Nunca a cor da sua pele ou a sua “identidade racial”. Avaliar a política
de cotas é tarefa muito difícil, e é cedo para dizer qualquer coisa. Eu apenas
queria chamar a atenção para o fato de que as cotas instituem a existência de
categorias raciais jurídicas: indígena, negro e não-negro (branco?). Devemos nos
indagar sobre as possíveis conseqüências disso. Temo que isso acabe fortalecendo
um Brasil imaginado não mais como país mestiço, mas como uma nação de raças
estanques. Os mais otimistas pensam que o Brasil em nada mudará. Sou mais
pessimista.



Nenhum comentário: