caro Dr. J.

carta ao caro Dr. J. (sinceramente, Mr. H.)

I

se eu não for
eu mesmo
é o mesmo que eu
ter morrido

se o que me salva
me anula
então não é a mim que salva

não sou eu
é o eu-
comprimido

que no instante em que surge
eu sumo
meu sumo se esvai
e eu morro

se me salvaria antes
um segundo
num segundo eu tomo
e me toma

e já não sou eu quem fala
é o outro
eu que não sou
eu mudo

eu que não falo
não sinto
eu que não existo
socorro

se o que me salva
me mata
não é a mim que salva

é de mim
o mundo

II

somos dois
no mesmo corpo

para mim não há cura
para ele não há mal

separa-nos o instante, o gesto
para ele, começo
para mim, final

para ele, vida
para mim, fatal

não podemos existir
um sem o outro
não podemos existir
um com o outro

somos dois dividindo
o mesmo corpo
um quase vivo
um meio morto

quem vive, vive
a carregar consigo
o peso morto
do próprio corpo

a sombra pesada
de (não) ser
o outro

4 comentários:

Flávia Muniz Cirilo disse...

aquelas pessoas dentro do dentro...

Anônimo disse...

você consegue saber quem é você mesmo e até o que é o peso de fora? é um eterno estranhamento para mim.

Paula Groff disse...

Meu filho, dei um chá de apariço, e um chá de sumiço, mas o seu blog continua muito bom. Essa gente coerente é um negócio.

Dimitri BR disse...

pois é, flávia:
medo da sua/nossa familiaridade com esse pessoal. ui.

cara graciete:
bem vinda por estas bandas! hum, não, justamente: difícil é saber o que é dentro e o que é fora nessa história...

aff, dear paula groff:
de fato, achei que íamos tomar um café. mas, ao invés disso, dois chás; já é um começo! :P

beijos para as três.